31 de out. de 2008

"amarradão na torre dá pra ir pro mundo inteiro
e pra onde quer que eu vá no mundo
eu vejo a minha torre
e é só balançar
que a corda me leva de volta pra ela..."

Como é difícil falar com meu pai no msn. Ele demora meia hora para escrever uma frase, e eu não estou exagerando não. Meia hora. Eu já escrevi mil linhas, falei trocentos assuntos. E ele respondendo que tá tudo bem sim. Ai ai. Claro que é engraçadíssimo, além de um tantinho irritante.
E cá estou novamente, Maputo. Com internet que funciona. Porque em Beira a coisa é braba. Google talk simplesmente não funciona lá, esquece. Malemá funciona e-mail, num cai-não-cai sem fim.
Mas foi bom estar em Beira, muito bom.
Hoje a despedida foi um tanto estressante, uns contratempos, fiquei meio tensa. Aí tive ataques de paulistana no hotel e nos dois aeroportos. Porque aqui acontece tudo aquilo que em SP a gente acha inadimissível, motivo pra barraco. Como por exemplo, na hora de fazer check-out no hotel, o povo querer me cobrar, sem atentar-se pro fato que a empresa é que paga, faturado por uma agência. Que só assim eu pude fazer check-in, inclusive, porque tinha reserva feita pela empresa. E pensa que eles entendem? Não, insistem que eu tenho que pagar. Até eu ligar na empresa, e alguém ligar de volta, dar um pito. Mas óquei, isso é regra aqui e eu lido bem. Mas hoje eu estava bem paulistana. E quando chego em Maputo, aquela zona. Um esteira mínima para um milhão de malas, e as pessoas se amontoando, sem aquela mínima noção de como se comportar no caos (coisa que paulistano faz magistralmente). Então foi me enervando. Tem horas que simplesmente não dá pra lembrar que oh, aqui o referencial é outro. Tudo que eu queria eram as mil esteiras de Congonhas. Muito bem, aquele caos, aquela desorganização, eu vou saindo, uma senhora que controla a saída vira e diz: a senhora não está a ver que aqui tem fiscalização? não pode sair. E eu: não estou a ver. e vocês, não estão a ver que isso aqui está uma bagunça?
Claro que ela não entendeu nada. Aqui o referencial é outro.

29 de out. de 2008


São tantas as aventuras nessa África.
Fui para Búzi ontem, voltei para Beira hoje. Búzi é um lugar perdido no fim do mundo, e para chegar, claro, a viagem é longa, é sacolejante. E cheia de árvores, e bichos, e de vez em quando algumas palhotas no caminho. E eu não tirei foto das palhotas. Queria, mas o carro ia rápido, e balançava tanto. E às vezes me dava preguiça, também.
De Búzi fui para Nova Sofala. Que é um lugar bem bonito, cheio de coqueiros. E de vento. Uma bela combinação, coqueiros e vento.
É um lugar cheio de gente também. Quer dizer, cheio, cheio, não é, pela própria natureza do lugar. Mas tem gente, gente interessante. Que eu tive muita vontade de fotografar. Mas não tive muita coragem.
Porque num lugar daquele, um carro 4x4 chama muita, mas muita atenção. Todo mundo olhava para mim, o tempo todo. E eu não me sentia à vontade para fotografar. Quase não fotografei Nova Sofala. Não gosto nem um pouco de ser a branca fotografando o exótico, isso me dá uma sensação ruim. Aí travo. Nada de fotos.
O que por um lado é bobeira minha, talvez. Porque algumas pessoas eu queria mesmo fotografar. Como as mulheres indo cuidar de suas machambas* às sete da manhã. Quando, na minha vida, eu iria ver mulheres com enxadas na cabeça, às sete da manhã, na África? Pois é. Mas não fotografei. Elas olhavam para o carro, e eu deixava pra lá.
Vale explicar que por aqui as mulheres é que são responsáveis pela plantação. E fiquei pensando que a mulher moçambicana é uma incógnita para mim. Porque poderíamos dizer que são submissas, sim. Esse país é muito machista. Mas são ao mesmo tempo tão fortes, mas tão fortes. Impressionam.
Foto eu só tirei mesmo da travessia que fizemos, por um riozinho pequenino. Mas que o motorista ficava lembrando: há muitos crocodilos por essa região. Não disse que era aventura?
E eu gostei tanto de mim, "sozinha" nessa África distante. Sozinha entre aspas porque estava com duas pessoas de confiança, e nativas, a me acompanhar, como dizem aqui. Mas mesmo assim. Recordei o medo que passei da outra vez. E é muito bom quando nos vemos superando medos. Gostei de me ver mais corajosa. Mais tranquila. Gostei.
E gostei demais de rever aquele distrito de Búzi, perdido no meio do nada. Que marca um momento tão importante para mim. E voltar lá só pôde ser considerado por mim um presente. Uma oportunidade importante de rever coisas e me rever. E de sentir um quentinho no peito. Acho que sou uma pessoa de sorte.

*machambas são plantações. de milho, arroz, mandioca. e mais coisas. acho.
**a foto é do riozinho que tem crocodilos.

24 de out. de 2008


"Andei pra chegar mais longe
E de lá de longe, me ver feliz

Andei pra valer a pena
Olhei pra trás, pro que é meu
Nosso passado me acena
Pelo que foi, já valeu"
Lenine

Um pouco mais sobre estar em Beira. Ontem desci para jantar, os garçons todos vieram falar comigo. Felizes em me rever. Lembrei do dia que fui embora. Tendo "morado" no hotel, criamos laços com os garçons, com as arrumadeiras. Foi triste imaginar que nunca mais nos veríamos. Mas enfim, voltei. Muito bom rever essas pessoas.
O dia em que fui embora foi difícil. Eu queria muito voltar para casa. Estava hospedada num quarto de hotel minúsculo, sem luz no teto, como já disse. Não suportava mais a comida. Estava me curando de uma crise fortíssima de cistite. Sentia falta de casa sim.
Mas ao mesmo tempo tinha vivido uma experiência muito intensa aqui. Nesta cidade, neste hotel, em dois quartos deste hotel - quando digo quarto falo do que vocês devem estar pensando, claro, mas não apenas. Falo do início de uma relação de maneira geral, que aconteceu nesta cidade, neste hotel, nestes dois quartos principalmente. E eu estava indo embora, mas A. não, ainda ficaria um tempo até voltar ao Brasil. Minha gente, como foi difícil deixar essa cidade, naquele final de abril de 2007. Mas hoje olho para trás, como na música do Lenine, vejo o que a gente fez para chegar aqui, no que a gente faz.

*a foto é de um lugar pertinho aqui do hotel, no caminho para o porto. foi onde saí pra passear com A. uma vez, num domingo, nós dois sozinhos. de minha parte, já o estava paquerando, ele até hoje não acredita. que neste momento ainda estava eu muito contida... hohoho

Cheguei à Beira, cidade na qual passei quase três meses da outra vez que estive por Moçambique.
Ainda estou meio atordoada por conta de um ar condicionado no avião, que ficou na minha cabeça o tempo todo e eu não tinha como desligar. Mas já foi bem interessante rever Beira. Muitas lembranças.
Agora, o hotel. Meu Deus, como é ruim. O quarto minúsculo de tudo. Não tem luz de teto, só abajur. Tomada extra também não tem. Nossa senhora, como passamos tanto tempo aqui eu não sei. Quer dizer, eu sei. Porque é aquilo, né? As recordações são bem boas. Desses quartos.

23 de out. de 2008

Tem um café em frente ao prédio que trabalho (que por sua vez é o mesmo prédio no qual estou hospedada: trabalho no sétimo e "moro" no décimo quinto andar). A gente pode tomar café lá, de manhã. E eu nunca tinha ido, porque acordo em cima da hora, etc. E nem sou fã de café da manhã. Mas hoje fui, estava com vontade de comer o pastel de nata, que o namorado disse que é gostoso. E é gostoso. Mas veja. Às nove da manhã é um pouco demais. Eu não sou uma pessoa matutina, e nem meu estômago. Não tem jeito.
E por falar em pastel de nata, essa região na qual estou, aqui é Maputo, tem muita influência portuguesa. Muito restaurante português, muito sotaque português (porque é preciso dizer: o sotaque do moçambicano não é tão carregado pelo português. tem mais a ver com a língua local. é bem bacana). Mas enfim. A questão é que eu estou num lugar tomado por estrangeiros. Então o que acontece é que eu conheço uma parte muito pequena de Maputo.
Já em Beira, para onde vou amanhã, é diferente. Conheci os melhores restaurantes da cidade (que devem ser dois, três), mas conheci a casa dos motoristas, o centro comercial popular. Lá eu interagi muito mais com Moçambique do que aqui.
Sinto vontade de andar por Maputo, mas fora desse circuito. Já ouvi falar que há uma feira popular de capulanas, vou tentar encontrar alguém para ir junto. Alguém local, entenda-se bem. Porque eu moro em São Paulo, que é uma cidade muito mais violenta que Maputo, claro. Mas em São Paulo eu conheço os códigos. E apesar de continuar sendo branca de olho azul quando ando pela periferia, onde sabemos, há muito pouco branco de olho azul, eu conheço minimamente os códigos. Aqui eu não conheço e, além disso, o impacto de ser claramente estrangeira é muito maior. Porque é claro que os estrangeiros aqui estão a uma distância muito maior dos moçambicanos do que no Brasil. Mas muito maior.
E eu acho um saco isso. Porque eu não sou rica, meu deus, longe disso, anos luz. Mas o simples fato de ser estrangeira, trabalhar pra uma grande empresa, isso já me coloca a uma distância gigantesca do povo moçambicano. Claro que não é uma distância que eu ache interessante ,nem goste, nem pactue, nem nada. Estou falando do modus operandi das coisas por aqui, certo? Que é muito alimentado pelos estrangeiros, brancos, etc., claro que sabemos que a dominação se perpetua na manutenção sistemática da coisa. Então você não chega na cidade e se insere, simplesmente. Você fica num lugar onde os moçambicanos te servem, apenas. E então precisa procurar uma forma de furar isso. Bom, ainda tenho duas semanas.
Agora, é preciso dizer outra coisa. Não pensem que Maputo é uma cidade super estruturada, porque não é. A internet, por exemplo, é meio capenga (em Beira é muuuito pior). Mas isso é assunto para outro post.

22 de out. de 2008

Estar num país diferente do seu requer atenção aos códigos de convivência que não são os seus, certo? Então eu ainda não tinha começado a trabalhar com fone de ouvido, mesmo estando numa sala onde as pessoas falam alto e me atrapalham. Porque ninguém faz isso, e eu achei que pudesse ser mal interpretada. Mas enfim, aqui estou eu com fone de ouvido, porque hoje eles realmente estão impossíveis, falando pelos cotovelos, e eu preciso ler coisas. E eu não gosto de trabalhar com gente por perto. Resquícios acadêmicos, eu acho.
(Pois bem, agora além de falar o ser humano aqui na minha frente resolveu se levantar e fazer mímicas. Eu mereço).
E eu tenho algumas coisas para contar. Como por exemplo os acontecimentos num almoço que participei no domingo passado, na casa do meu ex-chefe, com quem trabalhei na primeira vez que estive aqui. Contando pro namorado o episódio, chamei o ex-chefe de branco colonizador. Mas não é bem isso. É brasileiro que queria ter sido branco colonizador. Então fala mal dos nativos o tempo todo. Que eles são lerdos, são pouco inteligentes, e mais uma série de coisas que me recuso a reproduzir. Pois muito bem. A minha pergunta é: por que o fulano não ficou no Brasil? Ou foi morar na Europa, nos Estados Unidos, no Alasca, já que também adora falar mal do Brasil? Por que será que esse ser humano escolheu morar em Moçambique, com esse povo tão pouco civilizado, como ele pinta? Olha. Me dá nos nervos essas coisas. E eu fico fazendo aquelas caras mais feias do munco, me viro na cadeira um milhão de vezes, porque não abro a boca. é o tipo de discussão que eu não devo entrar, senão sou capaz de bater em alguém. Ou melhor, nem é discussão, é só um despejar de preconceito mesmo.
Mas muito bem. Estavam lá também uns portugueses, eles sim os colonizadores, não? Que também falavam mal dos nativos. E contavam histórias, claro, acham que têm propriedade para isso, e na verdade só continuam o que sempre fizeram, contar a história a partir de sua perspectiva. E eis que começam a falar mal do Brasil, também. Falando mal do Lula, que esteve aqui semana passada*. Aí aquele que queria ser branco colonizador continua a despejar seu preconceito e diz que não gosta do presidente, um semi-analfabeto. E falam toda a sorte de asneiras, o bobão se sentindo muito integrado aos portugueses, feliz da vida, porque ele no fundo queria mesmo ser um deles, né? Até que os portugueses deixam claro, você não é um de nós. E sabe como? Dizendo, ao iniciar uma conversa sobre portugês de portugal e português nas ex-colônias: o que vocês falam não é a língua portuguesa. Aí a esposa do bobão esbraveja, o que falamos é português sim. Mas a fronteira sempre tão necessárias a qualquer explicitação de preconceito está definida, ok?

*então, o Lula esteve aqui. E ficou no hotel no qual eu ia me hospedar, acreditam? Que eu perdi a oportunidade de tomar café da manhã com ele? Eu não acredito até agora.

18 de out. de 2008


Hoje Maputo estava assim. Depois de dois dias de cão, ou melhor, de cistite, a cidade me acolheu ensolarada. E fui almoçar num restaurante português, comi bacalhau. Fomos a pé e eu gostei muito de passear por Maputo, não conheço quase nada por aqui.
Antes disso tomei café no apartamento com a colega de trabalho e de hospedagem. Conversamos bastante, ela fala muito (e fuma muito!). Eu sabia que ia aprender bastante coisa com ela, por aqui. E é muito engraçado, ela comenta fofocas do trabalho e diz: eu não devia ter contado isso! É sempre assim, né?
Depois fomos ao shopping. O shopping daqui merecia uma foto. Colunas e piso que parecem uma boate brega, e as escadas rolantes têm neon. Mas as lojas são bem parecidinhas com qualquer uma de São Paulo, Rio, BH. A tal da grobalização em África. Na capital do país, é claro. Uma capital que tem muito da África do Sul. Mas Beira, meu destino semana que vem, não é assim não.
Gente, agora que me toquei que são uma e meia da manhã e tá passando Jornal Nacional na Globo Internacional. Oxi.
Mas muito bem. Fui ao Hiper Maputo também. Parece o Carrefour do Shopping Eldorado. Mas só tem indiano, que é gente que tem dinheiro aqui. E não é que o mercado seja caro (algumas coisas menos básicas até são). É que esse tipo de consumo não atinge a média da população mesmo. Estamos em Maputo, mas na África, né? Ah, vá. Poderia ser no Brasil também. Só que no Brasil os indianos são muitos, e diversos.
Que mais? Achei o chá que amo de paixão e só tem por essa bandas. Chama rooibos. Descobri que tem caixa com 160 sachês que custa uns três reais. Vou levar quilos.
E amanhã tem show de jazz num sei onde com uma colega que fiz por aqui hoje. E agora vou dormir, Maputo News fica por aqui.

17 de out. de 2008


Bom, minha gente. A foto não está boa, nem o dia estava lá muito bonito, mas aí está a vista do apartamento onde estou hospedada aqui em Maputo.
Não escrevi antes porque estava sem computador, depois com computador mas sem internet, agora tenho os dois, vamos lá. Acho que vai ser possível escrever um bocadinho.
O dia hoje está feio, e eu estou no apartamento, porque acordei com cistite. Para quem não sabe, tive uma mega crise de cistite na primeira vez que estive aqui. Mal cheguei e a danada me pega de novo. Mas parece um pouco mais branda dessa vez. E eu trouxe remédio do Brasil, estou aqui me automedicando.
A viagem até aqui foi muito boa. Falei meu inglês tupiniquim no avião e no free shop, fiquei toda orgulhosa. Porque eu sempre acho que não sei nada de inglês e não é bem assim. Porque eu até entendi que o vendedor do free shop tava me cantando. Aí fiz que não entendi, mas entendi. Então não é verdade que eu não sei falar ou não entendo nada. Eu me boicoto, essa é a verdade.
Mas a despeito de todo e qualquer autoboicote, comprei uma papete no free shop da África do Sul, que é super legal, e o melhor foi ter achado que custou 30 dólares e na verdade descobrir que custou 21. Vejam que eu realmente não sei fazer conta.
Agora deixa eu correr ali pro banheiro. Em breve volto com notícias direto de Maputo.

11 de out. de 2008


Arrumando mala, a tarefa é difícil e engraçada. Porque, serviço de utilidade pública, aviso que as malas costumam desaparecer na South African Airlines. Então estou fazendo uma mala de mão com aquelas peças de roupa que eu não gostaria que desaparecessem, de jeito nenhum. Queria colocar nela todos os sapatos e livros, claro. Mas não cabe. A maledeta pode ter no máximo oito quilos, né? Tou levando um livro que pesa 1,3 kg. Esse vai na bolsa de mão. Não tem jeito.
Mas ao mesmo tempo, descobri que tenho umas roupas das quais quero me livrar. Vou levá-las na malona, que é enorme e está vazia. Se essa mala não extraviar, serei obrigada a doar as roupas quando voltar. Compromisso firmado.
O fim de semana com namorado em Maputo não deu certo porque não deu certo eu viajar na quinta (posto que estou aqui fazendo mala...), agora viajo segunda. Então vou buscar o namorado no aeroporto daqui a pouco. De ônibus, veja você. Tou achando isso muito engraçado.
Já está quase tudo pronto. Mala grande, mala pequena, só não decidi o que fazer com a bolsa de mão e o computador. Queria levá-lo. Veremos, veremos.
E ontem comprei remédios. Gastei uma fortuna na farmácia, que ódio. Porque odeio remédio, não os tomo nunca. Mas da outra vez que fui, passei super mal por lá e precisava mesmo ter um antibiótico e cositas assim. A coisa lá é punk, não tem atendimento médico com facilidade, como vocês podem imaginar. Então comprei. E fico olhando praquilo querendo não precisar tomar nunca. O que significa que terei jogado meu dinheiro no lixo. Mas ok. Melhor que seja assim.

10 de out. de 2008


Então. Assisti O Ensaio sobre a Cegueira. Tava receosa demais de ver o filme, porque é aquilo, gostei tanto do livro. Mais tanto. Achei que ia detestar o filme e pronto.
Mas o que se sucedeu foi o seguinte: o filme me pareceu fazer mais sentido para quem leu o livro, e nisso ele é bastante interessante. Não sei se uma pessoa que não leu sente o filme da mesma forma. Então eu gostei. Porque fui recuperando o livro na minha cabeça a partir do filme. E lembrando, por exemplo, das imagens que fazia na minha cabeça enquanto lia. Que, por exemplo, a mulher do médico na minha cabeça não tinha uma fisionomia definida. E o sanatório era um lugar branco, porque a cegueira era branca. E aí no filme o sanatório é de outra cor, hostil. Meirelles faz o mesmo que fez em Cidade de Deus, onde deu ao filme a cor da favela. O sanatório tinha a cor de um sanatório, apesar de eu nunca ter entrado em um, eu imagino que seja assim, como ele exibe. Então eu gostei do filme.
Até que chega a cena final. E tem um narrador absolutamente mal colocado ali, eu achei. Eu finalizaria sem narrador, achei ruim a opção. Além disso, o final do filme não é como o final do livro. Isso também foi estranho para mim. Mas não compromete muito, eu acho. Compromete um pouco, vai.

*e a julianne moore pra fazer a mulher do médico foi perfeita. não tinha escolha melhor.

9 de out. de 2008

meu pedido pro universo antes de dormir:
eu quero trabalhar numa coisa que me dê tesão, que faça sentido.
Estou exausta, acordei super cedo para trabalhar nos últimos dois dias. E trabalhei até a hora em que o interfone tocou e eram as amigas chegando para o jantar. E ainda bem que elas vieram, ainda bem que elas existem, e são tão sacadas, e inteligentes. E ainda bem que elas me conhecem tanto e sempre me falam as coisas mais legais. Porque no final das contas eu ainda não sei bem pra onde vou. Mas qualquer que seja minha dúvida, poder compartilhar com as minhas amigas é tão rico. A vida parece até que fica mais leve.

6 de out. de 2008


Rubens Gerchman - Purple Couple

Tendo tanta, mas tanta coisa a fazer, hoje saí do trabalho e não sabia pra onde ir. Sério mesmo, eu parecia uma barata tonta no centro da cidade de São Paulo, coisa muito apropriada, diga-se de passagem. Não sabia se ia ao mercado comprar umas poucas frutinhas. Não sabia se ia tirar dinheiro, onde fica mesmo o banco real? Quem sabe ir direto pra casa, afinal, tenho tanta coisa pra fazer. De táxi ou de metrô, porque de metrô ando um bocado. Aí decidi fazer tudo junto. Tirei dinheiro, peguei metrô, jantei na rua, passei no mercado e de lá voltei de táxi. Agora estou aqui ensaiando começar a trabalhar. Pra começar, tenho que tirar Chico Buarque da vitrola, porque com ele cantando eu me desconcentro. E por aí vai.
Porque além de tudo o que é objetivo e está aqui gritando: faça!, além disso eu estou com a cabeça tão cheia de coisas. A viagem, né? Que significa tantas coisas nesse momento. Uma distância tão necessária do trabalho, apesar dessa viagem ser trabalho. Outra distância que não é nada necessária, mas que pode ser vivida com segurança. E isso é tão especial. E também é difícil porque quase nada que conheço e lá muito fácil. Mas é especial sendo difícil.
E tem os olhos do A. a me desconcentrar. Hoje tou romântica, tou piegas. Que desde manhã cedinho, olhando ele se mexendo entre todos os afazeres, eu ia sentindo tanto amor por ele, tanto. Cê tem toda razão, Mary, e a nostalgia talvez já tenha começado hoje. E nesse embalo vou contar um segredinho: quando me apaixonei por A. às vezes chorava de felicidade. Tão encantada no amor que se anunciava, me emocionava mesmo, olhos cheios d'água em pensar. Aos poucos isso vai dimuindo que a vida da gente nunca é um eterno looping emocional, coração não aguenta, então vai dando lugar a outras formas de sentir. Mais brandas, diriam. Não sei. Mas hoje, pensando nos olhos do amor, os meus encheram de lágrima. De certeza que a gente precisa sentir de quando em quando. Certeza de que ganhei o presente mais bonito, em Moçambique. Acho que vou lá agradecer.


Ainda inconformada com a votação do Kassab aqui na terra da garoa e do engarrafamento - apesar de concordar com ela, surpresa não é, é mais triste mesmo - , me preparo para um dia de trabaho intenso (minha cara de pau é enorme, dizer que me preparo para um dia de trabalho intenso às onze e meia da manhã... uma tarde de trabalho intenso, vai)
E os próximos dias serão de trabalho intenso, todos eles, porque quinta-feira eu embarco para Moçambique. Para quem não lia meus blogs antigos, devo dizer que já fui à Moçambique ano passado, início desse mesmo trabalho que vou lá agora finalizar. Fico uns dias em Maputo e mais dias em Beira, a cidade em que o Mia Couto nasceu e na qual eu me apaixonei.
Porque quem não lia blog antigo também não deve saber que foi em Moçambique que me apaixonei pelo namorado, também conhecido como o moço dos olhos mais bonitos. Que hoje no carro, a caminho do trabalho, brilhavam de uma forma tão especial, daquela forma que faz a gente se apaixonar mais uma vez, e muitas vezes.
Nós praticamente nos conhecemos em Moçambique porque antes da viagem só havíamos nos visto umas duas vezes rápidas, na empresa. A coisa foi assim: formávamos uma equipe de quatro pessoas que nunca tinham se visto na vida e foram se conhecer na África, fazendo um estudo de impacto ambiental na cidade da Beira. E foi coisa muito boa na vida esse trabalho e os frutos que deu. Estou bem animada para voltar e olhar aquele lugar tudo de novo.
E a viagem começa bem porque encontro o namorado em Maputo na sexta e passamos o fim de semana juntos. Ele volta, eu fico. E inevitalmente, quelque chose em Moçambique terá muita história pra contar. Mas antes disso, a pessoa que vos escreve tem tanta, mas tanta coisa pra fazer. Que nem dá pra entender como estou aqui sentada, escrevendo no blog.

Tava acompanhando a apuração das eleições, e claro, estou super decepcionada com esse resultado. Acreditando de verdade que é possível reverter isso à favor da Marta, mas. São Paulo sempre me sai com essas nas eleições, sempre.
Resultado bastante inesperado em BH também. Mas esse como resposta da lambança do Pimentel. E a cidade perde.
E no Rio, Gabeira no segundo turno, como muitos queriam. Eu, que não vejo nada de esquerda no Gabeira hoje em dia, não sou nada otimista com o segundo turno carioca. Em compensação em Salvador, muito bom ACM Neto fora da disputa. Muito bom mesmo.
E mudando de assunto, na sexta vimos o show da Mônica Salmaso e Pau Brasil, finalizando a turnê do cd maravilhoso, Noites de Gala, Samba na Rua. A boa nova é que eles lançaram um DVD, que, dispensa dizer, é imperdível.

1 de out. de 2008

Eu não ando muito de ônibus pela cidade. Na verdade, até pego ônibus algumas vezes na semana, mas fico muito pouco, dois pontos só, porque moro muito perto do trabalho, mesmo. No mais meus principais meios de transporte são metrô e táxi. Porque moro meio perto de tudo, então táxi não sai muito caro. Muito bem, mas hoje peguei ônibus, tarde da noite, e fiquei dentro dele por um bom tempo. E me vi completamente amedrontada, medo de ser assaltada no ônibus. Pode ser que tenha a ver com o fato de, fazendo pesquisa sobre violência em BH, um delegado me contar da ala incidência de assaltos a ônibus. E com certeza tem a ver com o fato da minha irmã ter contado outro dia que uma amiga dela foi assaltada exatamente nesta linha de ônibus que peguei hoje. E por que estou contando essa ladainha toda? Porque me entristece esse viver com medo das coisas. De verdade, muito ruim essa sensação de viver acuada. E olha que eu não sou uma pessoa que dá muita bola pra violência urbana não, viu? Isso assusta ainda mais, na verdade.
E por falar em problemas da cidade, hoje vi o Kassab. Já contei que o comitê do homi é no prédio onde o namorado deixa o carro estacionado? Pois é.