Há dias ronda por aqui umas idéia sobre democracia e representação, assuntos que ocupam lugar cativo nessa minha cabeça que tem ciência política como formação. E a eleição traz muita lenha pra queimar sobre o assunto, por supuesto.
Aí lendo esse post da querida
Mary W, e o
post da Camila sobre Netinho de Paula, me deu vontade de escrever sobre representação.
Comecemos pelo Netinho, candidato a senador por São Paulo, pelo PCdoB. O dilema: votar ou não votar num candidato que tem em sua biografia caso ou casos de agressão à mulheres?
Para entrar nesse terreno, me parece pertinente voltar à idéia de representação. Então eu digo que acho bastante legítimo uma militante do movimento feminista não votar em Netinho. Porque essa militante tem uma causa, e essa causa luta contra exatamente isso, a violência contra mulher, nas suas várias e várias formas. Mas aí temos um
manifesto de feministas que apoioam Netinho. E eu digo que acho bastante legítimo, também, esse voto e esse apoio. Por quê? Porque sou da turma do deixa disso e gosto de todo mundo? Não. Porque eu vejo uma clara representatividade nesse voto. Observem que as feministas que apoiam o Netinho são também militantes do PCdoB. Temos aí duas causas: o feminismo e o partido. E a junção entre movimento social e partido não é apenas comum, como de grande valia: agrega força e voz ao movimento.
Logo, ambas posições são legítimas e dignas de respeito. Seria possível argumentar que a posição das militantes feministas do PCdoB (e também do PT, que é da coligação) colocam o partido acima da causa feminista quando optam por um voto "pragmático" como esse, pois o partido está acima da causa, etc. etc. Seria possível, mas digo logo que discordo desse argumento. E acho raso. Porque existem alas do movimento feminista que acreditam que, através da política e da eleição de quadros do partido para o qual militam, pode-se obter ganhos efetivos para a causa feminista. Seja simplesmente (e sabemos que não é pouco) por colocar o assunto na pauta e fazer dele agenda de política, seja pelas políticas que efetivamente se consegue implementar quando se tem no senado um candidato do seu partido.
Porque, de feminismo eu entendo pouco, assumo e retomo daqui a pouco. Mas de política partidária entendo um pouquinho mais. E digo que é apressada a análise de quem não reconhece que depois de toda a discussão em torno do crime cometido por Netinho, ele vai para o Senado e se lixa para a questão da mulher, ou comete de novo um crime e etc. etc. etc. Netinho será MUITO cobrado por cada uma dessas mulheres militantes que o apoiam. Ou a gente vai achar que mulher é bobinha e tá apoiando o cara como pau mandado do partido? Não, a gente não vai achar isso, né? Peloamor.
Então meu resumo da ópera 1 é: as militantes feministas que apoiam Netinho acreditam que é melhor tê-lo como Senador do que perder a vaga para um Tuma (exemplo de respeito aos direitos humanos). Vão cobrar dele cada centavo desse apoio, porque não são bobinhas, ao contrário, são mulheres de luta, e diante disso, admiráveis. E tem mais uma coisa. São tão espertas, essas feministas, que se aliam a um cara com grande representatividade: um negro da Cohab.
E vamos lá: Netinho representa sim o negro, pobre, da periferia, chegando ao Senado. Tem apelo popular. Tem apoio em movimentos de base (e pra quem não conhece movimento de base é preciso dizer: isso é bem importante nas periferias, é uma das principais bases do PT e esses caras não são de brincadeira não: vão cobrar o cara também). Tem apoio do movimento negro. Porque, afinal de contas, essa também é uma causa, ou não é? Quem disse que o feminismo é mais legítimo que o movimento negro? Ninguém me disse, e espero, não diga nunca, nem insinue. São movimentos importantíssimos. Somados, nossa. Enchem de legitimidade o voto. E vamos lá: temos uma feminista candidata. Temos a chance de ter uma feminista e um representante do movimento de base apoiado pelo movimento negro. Não dá pra ter tudo, mas, sinceramente, temos bastante.
E eu confesso que sinto medo do voto elitista contagiando petistas e simpatizantes, sabe? O repúdio ao pagodeiro da Cohab, agressor de mulheres. Porque, se militantes feministas apoiam o cara (não são todas as militantes feministas, devemos ressaltar) e o que temos como alternativa a ele, de fato, é Tuma e Aloísio Nunes. Ah, minha gente. Sem demonizar, né?
E por fim eu faço minha declaração de voto. Pensei bastante para fundamentar meu voto no Netinho. E de antemão eu digo a vocês que seria difícil não votar pela orientação do partido. Porque, se estou falando de representação, preciso falar do que me representa. E antes de mais nada, em se tratando de política, o PT me representa. E eu tendo a confiar, na maioria esmagadora das vezes, nas orientações do meu partido. Mas em se tratando do Netinho, foi preciso refletir. Porque o feminismo também é uma causa no meu mundo. Embora eu não seja feminista no sentido literal do termo - e eu digo isso com muito respeito ao movimento: não tenho história no movimento feminista para me intitular uma feminista como me intitulo petista - eu considero a causa de suma importância, ela tem todo meu apoio, respeito, e a militância. Aí procurei saber o que as militantes feministas do partido pensavam. Conversei com amigas feministas. E formulei a minha argumentação de voto que é a seguinte: temos uma feminista no Senado. E com Netinho, teremos um representante do movimento de base. Eu considero essa dupla bastante representativa para o partido. E sei que, se o partido o escolheu, vai cobrar dele postura digna de um senador que foi apoiado pelo PT e sua história enquanto partido de base; as feministas que o apoiam vão cobrar também. E eu prefiro claro, dois senadores da nossa coligação do que um voto de protesto*. E eu prefiro também, que ele esteja do nosso lado, envergonhado pelo que fez e respondendo à altura do apoio que recebeu. E vocês podem dizer que eu sou otimista demais, que lhes digo, sou mesmo: é bacana quando a militância carrega otimisto, na minha modesta opinião. E otimismo foi o que eu nunca deixei de ter com meu partido. Até agora, temos ido muito bem.
*voto de protesto é o que seria possível nesse caso, pois a candidata feminista não tem chance de ganhar. mas fique claro: eu respeito o voto de protesto de feministas que fizerem essa opção. e acho legítimo.**continuando a falar sobre representação, quero escrever sobre tiririca. mas me inventaram uma prova de francês na semana da eleição que embolou o meio de campo que já é naturalmente embolado. então, fico só na promessa, por enquanto.
***se você não leu o post abaixo, acho pertinete nessa última semana de campanha. assinado: a modesta.